Saltar para o conteúdo

From Russia, with Love (livro)

Origem: Wikipédia, a enciclopédia livre.
From Russia, with Love
From Russia, with Love (livro)
Capa da primeira edição britânica
Autor(es) Ian Fleming
Idioma Inglês
País  Reino Unido
Gênero Espionagem
Série James Bond
Arte de capa Richard Chopping
Editora Jonathan Cape
Lançamento 8 de abril de 1957
Páginas 253 (primeira edição)
Cronologia
Diamonds Are Forever
Dr. No

From Russia, with Love[a] é um romance britânico escrito por Ian Fleming e o quinto a ser protagonizado pelo agente secreto James Bond. A história centra em um plano da agência soviética SMERSH para assinar Bond de tal forma a desacreditar ele e o Serviço Secreto Britânico, usando para tal iscas na forma de uma bela escrivã de decodificação e uma máquina decodificadora soviética. O livro foi publicado pela primeira vez no Reino Unido em 8 de abril de 1957 pela editora Jonathan Cape.

Fleming escreveu o romance no começo de 1956 em sua propriedade Goldeneye na Jamaica, na época pensando que este poderia ser seu último livro de Bond. Boa parte da história se passa na cidade de Istambul e no Expresso do Oriente, que foram inspirados por uma viagem que Fleming fez a Turquia em nome do The Sunday Times no ano anterior a fim de cobrir uma conferência da Interpol; ele retornou para o Reino Unido através do Expresso do Oriente. From Russia, with Love mostra as tensões entre ocidente e oriente na Guerra Fria e o declínio do poderio e influência britânicos na era pós-Segunda Guerra Mundial.

From Russia, with Love foi muito bem recebido pela crítica na época que foi lançado. Suas vendas foram impulsionadas por uma campanha de divulgação que capitalizou a partir da viagem que o primeiro-ministro britânico sir Anthony Eden fez a propriedade Goldeneye, além da publicação de um artigo na revista Life que listava o romance como um dos dez livros favoritos do presidente norte-americano John F. Kennedy. A história foi serializada no jornal Daily Express, primeiro em uma forma reduzida e depois como uma tirinha. Foi adaptado em 1963 como o segundo filme da franquia James Bond, estrelando Sean Connery.

"Embora este fato não tenha importância, grande parte do pano de fundo desta história foi descrita de modo preciso.

A SMERSH, uma contração de Smiert Spionam – morte aos espiões – existe e é, até hoje, o departamento mais secreto do governo soviético"

Ian Fleming, Nota do Autor[2]

A SMERSH, a agência de contraespionagem soviética, planeja cometer um grande ato de terrorismo no campo na inteligência. Para isso eles selecionam como alvo o agente James Bond do Serviço Secreto Britânico. Ele foi listado como um inimigo da União Soviética em parte por seu papel nas derrotas de Le Chiffre, Mr. Big e Hugo Drax, todos agentes da SMERSH, com um "mandado de morte" sendo emitido contra ele. Planeja-se que sua morte precipite um grande escândalo sexual que irá correr pela imprensa mundial durante meses e destruir a reputação do Serviço Secreto Britânico. O assassino de Bond será Red Grant, um psicopata e carrasco da SMERSH cujos impulsos homicidas coincidem com a lua cheia. Toda a operação é planejada por Kronsteen, mestre planejador da SMERSH, e pela coronel Rosa Klebb, a chefe da divisão de Operações e Execuções. Eles instruem a cabo Tatiana Romanova, uma atraente jovem escrivã de decodificação, a fingir a deserção de seu posto em Istambul afirmando que ter se apaixonado por Bond após ver uma fotografia dele em um arquivo. Romanova, como uma isca a mais, promete entregar aos britânicos um Spektor, um dispositivo de decodificação soviético muito desejado pelo MI6. Entretanto, ela não é informada sobre a verdadeira natureza do plano.[3]

O Expresso do Oriente, em que Bond e Romanova viajam de Istambul a Paris.

A oferta de deserção é recebida com suspeitas pelo Serviço Secreto Britânico em Londres, supostamente direto de Romanova, porém é condicional que o próprio Bond vá pegá-la e o Spektor em Istambul. O MI6 não sente segurança sobre os motivos de Romanova, porém a oferta do Spektor é muito tentadora para ser ignorada, assim M aprova a missão. Bond viaja para a Turquia e encontra-se com Darko Kerim, chefe da estação local do Serviço Secreto Britânico. Ele conhece Romanova e planeja sua saída do país na posse do Spektor. Bond e Kerim acreditam na história dela e entram no Expresso do Oriente. Kerim rapidamente descobre que três agentes soviéticos da MGB estão a bordo viajando incógnitos. Ele usa subornos e truques para que dois deles sejam tirados do trem, porém é depois encontrado morto em uma cabine junto com o corpo do terceiro agente.[3]

Um agente do MI6 chamado "Capitão Nash" apresenta-se em Trieste e Bond presume que ele foi enviado por M para ajudá-lo no restante da viagem. Romanova suspeita de Nash, porém Bond garante que o homem é do Serviço Secreto Britânico. Os três vão descansar depois do jantar. Bond é acordado com uma arma apontada para ele e Romanova sedada, com Nash se revelando como o assassino Grant. Ele descreve o plano da SMERSH em vez de matar Bond imediatamente: Grant deve atirar em Bond no coração e se livrar de Romanova depois de implantar na bagagem um vídeo do casal fazendo sexo; além disso, o Spektor está armado para explodir assim que for examinado. Bond, enquanto Grant fala, consegue colocar sua caixa de cigarros de metal entre as páginas de um livro que está segurando na sua frente, posicionando-os a fim de parar a bala da arma. Grant atira e Bond cai no chão, porém ataca e mata seu assassino assim que ele aproxima-se. Bond e Romanova em seguida conseguem escapar.[3]

Bond, mais tarde em Paris, depois de ter entregue com sucesso Romanova e o Spektor para seus superiores, é emboscado em seu hotel por Klebb. Ela é capturada, porém consegue chutar Bond com uma lâmina envenenada escondida em seu sapato. A história termina com Bond caído no chão e lutando para conseguir respirar.[3]

"A respiração tornou-se difícil. Bond inflou ao máximo seus pulmões. Fechou os maxilares e semicerrou os olhos, como fazem as pessoas quando querem disfarçar a embriaguez.

[...] Agora ofegava. Levou de novo a mão ao rosto frio. Teve a impressão de que Mathis vinha em sua direção.

Bond sentiu que seus joelhos começavam a fraquejar.

[...] E então rodopiou e caiu estatelado no tapete de bordô."

Últimas linhas de From Russia, with Love

O autor britânico Ian Fleming já tinha publicado três romances protagonizados por seu agente secreto ficcional James Bond até janeiro de 1956: Casino Royale em 1953, Live and Let Die em 1954 e Moonraker em 1955. O quarto, Diamonds Are Forever, estava sendo editado e preparado para publicação.[4][5][b] Ele viajou no mesmo mês para sua propriedade Goldeneye na Jamaica a fim de escrever From Russia, with Love. Fleming seguiu seu procedimento usual, detalhado pelo próprio tempos depois na revista Books and Bookmen: "Eu escrevo por volta de três horas pela manhã... e faço outra hora de trabalho entre às seis e sete da tarde. Eu nunca corrijo algo ou volto para ver o que escrevi... Você escreve 2 000 palavras por dia seguindo minha fórmula".[7] Ele voltou para Londres em março levando consigo um manuscrito de 228 páginas,[8] que ele posteriormente alterou muito mais do que havia feito em suas obras anteriores.[9][10] Uma das reescritas mais significativas alterou o destino de Bond; Fleming tinha ficado desencantado com seus livros,[11] escrevendo para seu amigo o autor Raymond Chandler que "Minha musa está muito ruim... Estou ficando cansado de Bond e tem sido muito difícil fazê-lo passar por seus truques de mau gosto".[12] Ele reescreveu o final do romance em abril de 1956 para que Rosa Klebb envenenasse Bond, o que lhe permitiria terminar a série com a morte do personagem caso desejasse. O rascunho original tinham Bond e Tatiana Romanova curtindo seu romance.[13] Fleming tinha decidido até janeiro de 1957 que escreveria outra história, começando a trabalhar em Dr. No, no qual Bond está se recuperando do envenenamento na Jamaica.[14]

A viagem que Fleming fez em junho de 1955 para Istambul a fim de cobrir uma conferência da Interpol para o The Sunday Times serviu como fonte para muitas das informações de pano de fundo da história.[15] Lá ele conheceu Nazim Kalkavan, um dono de navios educado na Universidade de Oxford, que acabou tornando-se o modelo para Darko Kerim;[16] Fleming anotou muitas de suas conversas com Kalkavan em um caderno e posteriormente as usou verbatim no romance.[15][c]

"Gostaria de salientar que um homem na posição de James Bond nunca consideraria usar uma Beretta .25. É na verdade uma arma de mulher – e nem uma boa dama nisso! Ouso sugerir que Bond deveria estar armado com uma .38 ou uma nove milímetros – Digamos uma Walther PPK alemã? Esta é muito mais apropriada."

Geoffrey Boothroyd, carta para Ian Fleming, maio de 1956[18]

Apesar de Fleming não ter datado os eventos de sua história, John Griswold e Henry Chancellor – ambos os quais escreveram livros não-ficcionais para a Ian Fleming Publications – identificaram linhas do tempo diferentes baseadas em eventos e situações descritas na série literária como um todo. Chancellor estabeleceu que os eventos de From Russia, with Love se passavam em 1955, enquanto Griswold foi mais preciso e considerou que o enredo se passou entre os meses de junho e agosto de 1954.[19][20]

Fleming contratou o ilustrador Richard Chopping em agosto de 1956 ao preço de cinquenta guinéus para a criação da arte de capa, que era baseada em um desenho do próprio autor; o resultado final ganhou vários prêmios.[21][22] Fleming recebeu após a publicação de Diamonds Are Forever uma carta enviada por Geoffrey Boothroyd, um fã de Bond de 31 anos e especialista em armas, que o criticou por sua escolha de pistola para o personagem. As sugestões de Boothroyd chegaram muito tarde para serem implementadas em From Russia, with Love, porém uma de suas armas – um revólver Smith & Wesson .38 de cano curto com um terço da guarda de gatilho removida – foi usada como modelo para a ilustração de capa de Chopping.[23] Fleming posteriormente agradeceu a Boothroyd ao nomear o armeiro de Dr. No como Major Boothroyd.[24]

Desenvolvimento

[editar | editar código-fonte]

Inspirações

[editar | editar código-fonte]
Uma máquina Enigma, base para a fictícia máquina de decodificação soviética Spektor.

Fleming, assim como em várias de suas obras, apropriou nomes e passados de pessoas que conhecia ou tinha ouvido falar com o objetivo de criar seus personagens. Red Grant, um guia fluvial jamaicano – quem o biógrafo Andrew Lycett descreveu como "um gigante alegre e volúvel de aspecto vilanesco" – foi usado como base para o assassino meio-alemão e meio-irlandês.[25][26] Klebb foi parcialmente inspirada na coronel Rybkin, uma verdadeira membro da Academia Militar-Política Lenin sobre quem Fleming havia escrito um artigo no The Sunday Times.[27][28] A máquina Spektor que foi usada como isca para Bond não era um dispositivo da Guerra Fria, mas sim baseada na alemã Enigma da Segunda Guerra Mundial, a qual Fleming tinha tentado obter enquanto trabalhava na Divisão de Inteligência Naval.[29]

A ideia do Expresso do Oriente veio de duas fontes. Fleming tinha retornado da conferência em Istambul em 1955 a bordo do trem, porém achou a experiência monótona, em parte porque o vagão restaurante estava fechado.[16][30] Ele também sabia sobre a história de Eugene Karp e sua viagem no Expresso do Oriente: Karp era um adido naval dos Estados Unidos e agente de inteligência baseado em Budapeste que, em fevereiro de 1950, pegou o Expresso do Oriente até Paris carregando vários documentos sobre redes de espiões norte-americanas no Bloco do Leste. Entretanto, assassinos soviéticos o esperavam no trem. O condutor foi sedado e o corpo de Karp foi encontrado pouco depois em um túnel ao sul de Salzburgo.[31] Fleming há muito tinha um interesse por trens, também associando-os com perigo após envolver-se em um acidente quase fatal em 1927. Trens também estão presentes em Live and Let Die, Diamonds Are Forever e The Man with the Golden Gun.[32]

O historiador cultural Jeremy Black comentou que From Russia, with Love foi escrito e lançado em uma época em que as tensões entre leste e oeste estavam crescendo e a percepção pública sobre a Guerra Fria era alta. Uma operação britânica-americana para grampear as comunicações do quartel-general do Exército Vermelho em Berlim foi divulgada publicamente pelos soviéticos em abril de 1956. O mergulhador Lionel Crabb desapareceu no mesmo mês durante uma missão para fotografar as hélices do cruzador soviético Ordzhonikidze enquanto este estava atracado em Portsmouth, incidente que foi muito relatado e discutido pela imprensa britânica. Além disso, um levante popular na Hungria foi subjugado pelas forças soviéticas entre outubro e novembro.[33]

"James Bond é o ápice de uma tradição importante mas muito difamada na literatura inglesa. Fleming, quando menino, devorou os contos de Bulldog Drummond pelo tenente-coronel Herman Cyril McNeile... e as histórias de Richard Hannay por John Buchan. Sua genialidade foi reembalar essas aventuras antiguadas para encaixarem-se na moda do Reino Unido pós-guerra... Em Bond, ele criou o Bulldog Drummond da era a jato."

William Cook na New Statesman[34]

Fleming colocou aspectos de sua própria personalidade em Bond para que sua criação ficasse mais aprofundada. O jornalista e escritor Matthew Parker observou que o "tédio físico e mental" de Bond era um reflexo da saúde ruim e auto-estima baixa de Fleming na época em que escreveu o romance.[35][36] O autor adicionou mais detalhes sobre a vida particular de Bond, seguindo a partir do desenvolvimento do personagem nos quatro livros anteriores, com sua primeira aparição na história mostrando-o tomando café da manhã junto com sua governanta, May.[37] O autor Raymond Benson – que escreveria vários romances de Bond – enxergou aspectos de insegurança entrando na mente do personagem com a vida "branda" que ele estava levando ao ser introduzido na história. Benson identificou o medo de Bond quando seu voo para Istambul passa por grande turbulência, também destacando o aparente nervosismo do personagem ao encontrar Romanova pela primeira vez; ele parece estar preocupado e culpado por sua missão.[38]

Segundo Benson, os outros personagens do livro também foram bem desenvolvidos. Ele considera que Darko Kerim, o chefe da estação turca, é "um dos personagens mais pitorescos de Fleming". Kerim, para Benson, encaixa-se em um tipo similar da aliado confiável e simpático que Fleming já havia criado em Quarrel de Live and Let Die e criaria novamente em Colombo do corto "Risico".[39] Parker considera que o personagem é "um antídoto" para a letargia de Bond,[12] enquanto o escritor Umberto Eco enxergou Kerim como detentor de algumas das qualidades morais dos vilões da série, porém que essas qualidades são utilizadas para ajudar Bond.[40][41]

From Russia, with Love é uma das poucas histórias de Fleming em que os soviéticos são o inimigo principal,[42] porém Eco considerou que os oponentes eram "tão monstruosos, tão improvavelmente maus que parece impossível levá-los a sério".[43] O autor também apresentou uma oponente feminina, algo totalmente novo para ele, porém Klebb é descrita como fisicamente repulsiva, assim como muitos dos adversários da série, com pouca higiene e gostos vulgares.[44][45] Eco e Anthony Synnott consideraram que apesar de Klebb ser mulher, a personagem é mais um indivíduo de "gênero neutro".[40][41] Para Benson, Grant foi o primeiro "oponente psicopata" de Fleming.[44] Charlie Higson, que posteriormente escreveria a série Young Bond, achou que Grant era "um vilão muito moderno: o psicopata implacável e sem piedade com olhos frios e mortos de um 'homem afogado'".[46]

Higson afirmou que Fleming passou seus quatro primeiros romances mudando o estilo de seus livros e sua abordagem com os personagens, porém que em From Russia, with Love o autor "finalmente encontra a fórmula clássica de Bond, alegremente seguindo para sua fase mais criativa".[47] O analista literário LeRoy L. Panek observou que os romances anteriores eram essencialmente histórias de detetive episódicas, porém From Russia, with Love era diferente, possuindo uma "imagem de abertura estendida" que descreve Grant, os soviéticos e Romanova antes de seguir para a história principal e então trazendo elementos de volta quando menos esperado.[48] Os primeiros dez capítulos são dedicados a descrever os vilões e o pano de fundo da missão, com Bond só fazendo sua primeira aparição no capítulo onze.[49] Eco identificou as passagens iniciais apresentando Grant como um começo "inteligente", similar ao início de um filme.[d] Ele comentou que "Fleming abunda-se em tais passagens de grande habilidade técnica".[50]

Benson descreveu o que chamou de "Varredura Fleming", uma técnica que leva o leitor de um capítulo a outro usando "ganchos" no final dos capítulos a fim de aumentar a tensão e empurrar o leitor para o próximo.[51] Ele considerou que a "Varredura Fleming impulsiona o enredo" de From Russia, with Love, fazendo parecer que o livro tinha metade de sua duração mesmo sendo um dos romances mais longos escritos por Fleming.[49] Kingsley Amis, que depois escreveria um romance de Bond, achou que a história é "repleta de ritmo e convicção",[52] enquanto Parker identificou "furos" no enredo do livro, porém comentou que a "ação move-se rápido o bastante para o leitor não percebê-los".[53]

Fleming usou marcas conhecidas e detalhes do dia-a-dia a fim de criar uma sensação realista,[7][54] algo que Amis chamou de "o efeito Fleming",[55] em que "o uso imaginativo de informação, pelo qual a natureza permeavelmente fantástica do mundo de Bond... [é] trazida de volta para uma espécia de realidade, ou pelo menos equilibrada".[56]

Os historiadores culturais Janet Woollacott e Tony Bennett consideram que a nota de prefácio de Fleming, em que ele informa os leitores que "grande parte do pano de fundo desta história foi descrita de modo preciso", indica que em seu romance as "tensões da guerra fria estão massivamente presentes, saturando a narrativa do começo ao fim".[57] O conceito da perda de poder e influência britânicos pós-Segunda Guerra Mundial e no período da Guerra Fria estão presentes no livro, assim como em Casino Royale.[58] O jornalista William Cook observou que, com o Império Britânico em declínio, "Bond alcovitava para a auto-imagem inflada e cada vez mais insegura do Reino Unido, nos lisonjeando com a fantasia de que a Brittania ainda conseguia dar um soco forte".[34] Woollacott e Bennett afirmaram que "Bond encorporava a possibilidade imaginária que a Inglaterra poderia ser colocada mais uma vez no centro dos assuntos do mundo durante um período quando sua posição de potência mundial estava caindo rápido visivelmente".[57] Este reconhecimento de declínio é manifestado nas conversas de Bond com Kerim, quando o primeiro admite que na Inglaterra "não mostramos mais os dentes – só as gengivas".[58][59]

Woollacott e Bennett argumentaram que Bond é considerado pelos soviéticos como "a personificação mais consumada do mito da Inglaterra".[60] O crítico literário Meir Sternberg enxergou o tema de São Jorge e o dragão em várias das histórias de Bond, inclusive em From Russia, with Love. Ele considerou o personagem como São Jorge, o santo padroeiro da Inglaterra, comentando que o primeiro capítulo começa com a examinação de uma libélula (chamada em inglês de dragonfly) voando sobre o corpo de Grant.[61][e]

"Pessoalmente, acho que from Russia with Love foi, de muitas maneiras, meu melhor livro, porém a melhor coisa é que cada um dos livros parece ser o favorito com uma ou outra parte do público e nenhum até agora foi completamente repudiado."

Ian Fleming[29]

From Russia, with Love foi lançado no Reino Unido no dia 8 de abril de 1957 em capa dura pela editora Jonathan Cape.[62] A edição norte-americana foi publicada algumas semanas depois pela Macmillan.[21][63] A versão brasileira estreou em 1960 pela Editora Bestseller inicialmente com o nome de Espionagem, porém foi relançada em 1964 sob o título Moscou contra 007.[1] O primeiro-ministro britânico sir Anthony Eden visitou a propriedade Goldeneye de Fleming na Jamaica em novembro de 1956 a fim de recuperar-se de uma recaída de saúde. Isto foi muito relatado pela imprensa,[24] com o lançamento de From Russia, with Love sendo acompanhado por uma campanha promocional que capitalizou a partir do destaque público de Fleming.[64] Uma serialização da história no Daily Express no mesmo ano aumentou as vendas do romance.[65] O maior salto de vendas ocorreu quatro anos depois: o presidente norte-americano John F. Kennedy, em um artigo da revista Life de 17 de março de 1961, listou From Russia, with Love como um de seus dez livros favoritos.[66][f] Este reconhecimento e a publicidade acarretada levou a um salto de vendas que fez de Fleming o autor policial mais vendido nos Estados Unidos.[47][68] Houve outro grande momento de vendas após o lançamento do filme homônimo em 1963, que fez com que as vendas em brochura aumentassem de 145 mil em 1962 para 642 mil em 1963 e 600 mil em 1964.[69]

From Russia, with Love foi bem recebido pela crítica ao ser lançado.[70] Julian Symons do The Times Literary Supplement considerou que era o "conto mais tenso, excitante e brilhante" de Fleming, também comentando que o autor "traz o suspense de acordo com as necessidades emocionais modernas" e que Bond "é o Mike Hammer intelectual: um assassino com olho aguçado e coração mole para mulheres".[71] A crítica do The Times foi menos persuadida pela narrativa, sugerindo que "o retesamento e brutalidade gerais da história deixa o leitor pairando inquietamente entre fato e ficção". Apesar da resenha ter comparado Fleming em termos desfavoráveis a Peter Cheyney, um autor policial das décadas de 1930 e 1940, ela concluiu que From Russia, with Love era "emocionante o suficiente em seu tipo".[72]

Maurice Richardson, escrevendo para o jornal The Observer, achou que From Russia, with Love possuía uma "trama estupenda para emboscar... Bond, nosso agente mulherengo de luxo", também perguntando-se se "este é o fim de Bond?".[62] A crítica do Oxford Mail declarou que "Ian Fleming está em um nível próprio" de qualidade, enquanto a crítica do The Sunday Times chegou a argumentar que "se um psiquiatra e um copiador completamente eficiente se juntassem para produzir um personagem ficcional que seria o subconsciente da ambição masculina da metade do século XX, o resultado invariavelmente seria James Bond".[29]

Escrevendo para o The New York Times, Anthony Boucher – descrito por John Pearson, biógrafo de Fleming, como "um homem completamente anti-Bond e anti-Fleming"[73] – foi condenatório em sua resenha, dizendo que From Russia, with Love era o "livro mais longo e mais pobre" de Fleming. Boucher também escreveu que o romance tinha "como de costume, sadismo sexual com um aparência de alfabetização, porém sem os ocasionais momentos de ação brilhantes".[63] Por outro lado, a crítica do New York Herald Tribune afirmou que o "Sr. Fleming é intensamente observador, agudamente letrado e pode transformar um clichê em uma bolsa de seda através de alquimia astuta".[29] Robert R. Kirsch do Los Angeles Times também discordou de Boucher, dizendo que "o romance de espionagem foi atualizado por um praticante soberbo dessa arte quase perdida: Ian Fleming". Para Kirsch, From Russia, with Love "possui tudo do tradicional mais os mais modernos refinamentos na arte sinistra da espionagem".[74]

From Russia, with Love foi serializado no The Daily Express a partir de 1º de abril de 1957;[75] foi o primeiro romance de Bond que o jornal adaptou.[65] O livro também foi adaptado como uma tira de quadrinhos diária no mesmo jornal e vendida mundialmente. Esta série durou de 3 de fevereiro a 21 de maio de 1960,[76] tendo sido escrita por Henry Gammidge e ilustrada por John McLusky.[77] Esta tira foi republicada em 2005 pela Titan Books na antologia Dr. No, que também incluía Casino Royale e Diamonds Are Forever.[78]

O filme From Russia with Love foi lançado em 11 de outubro de 1963, produzido por Harry Saltzman e Albert R. Broccoli e dirigido por Terence Young. Foi o segundo filme de Bond produzido pela Eon Productions e era estrelado por Sean Connery.[79] Esta versão realizou algumas mudanças em relação ao romance, com os vilões principais sendo mudados da SMERSH para a SPECTRE, uma organização terrorista ficcional.[80] O enredo principal foi uma adaptação fiel do livro; o final foi alterado para deixar claro que Bond sobreviveu ao ataque de Klebb. Benson afirmou que "muitos fãs o consideram o melhor filme de Bond, simplesmente porque é o mais próximo da história original de Fleming".[81]

O romance foi dramatizado em 2012 para o rádio por Archie Scottney, dirigido por Martin Jarvis e produzido por Rosalind Ayres. Seu elenco tinha Toby Stephens como Bond e foi transmitido pela BBC Radio 4. Continuou uma série de adaptações para o rádio com Jarvis e Stephens, depois de Dr. No em 2008 e Goldfinger em 2010.[82]

  1. No Brasil, From Russia, with Love foi inicialmente publicado pela Editora Bestseller sob o título de Espionagem e depois como Moscou contra 007.[1]
  2. Diamonds Are Forever foi publicado em março de 1956.[6]
  3. Enquanto estava na Turquia, Fleming também escreveu um relato sobre o Pogrom de Istambul, que foi publicado no The Sunday Times em 11 de setembro de 1955.[17]
  4. A narrativa descreve Grant como um homem imóvel, deitado ao lado de uma piscina, esperando para ser massageado; não há uma conexão direta com o enredo principal.[50]
  5. Sternberg também salientou que o oponente de Bond em Moonraker é chamado Drax (Drache é dragão em alemão), que o sobrenome do personagem Marc-Ange Draco em On Her Majesty's Secret Service é dragão em latim e que o primeiro nome de Darko Kerim em From Russia, with Love é "uma variação anagmática no mesmo nome".[61]
  6. Robert F. Kennedy, irmão do presidente, também era um ávido leitor dos romances de Bond, assim como Allen Dulles, diretor da Agência Central de Inteligência (CIA).[67]
  1. a b «From Russia With Love». James Bond Brasil. Consultado em 9 de fevereiro de 2019 
  2. Fleming 1957, p. 6
  3. a b c d Fleming 1957
  4. Lycett 1996, pp. 268–69
  5. «Ian Fleming's James Bond Titles». Ian Fleming Publications. Consultado em 8 de fevereiro de 2019. Arquivado do original em 10 de agosto de 2015 
  6. Lycett 1996, p. 289
  7. a b Faulks & Fleming 2009, p. 320
  8. Chancellor 2005, p. 101
  9. Benson 1988, p. 13
  10. Fleming & Higson 2006, p. v
  11. Benson 1988, p. 14
  12. a b Parker 2014, p. 209
  13. Lycett 1996, p. 293
  14. Lycett 1996, pp. 307–08
  15. a b Chancellor 2005, pp. 96–97
  16. a b Benson 1988, p. 12
  17. Fleming, Ian (11 de setembro de 1955). «The Great Riot of Istanbul». The Sunday Times: 14 
  18. «Bond's unsung heroes: Geoffrey Boothroyd, the real Q». The Daily Telegraph. 21 de maio de 2009. Consultado em 8 de fevereiro de 2019 
  19. Chancellor 2005, pp. 98–99
  20. Griswold 2006, p. 13
  21. a b Benson 1988, p. 16
  22. Lycett 1996, p. 300
  23. Chancellor 2005, p. 160
  24. a b Benson 1988, p. 15
  25. Lycett 1996, p. 282
  26. Macintyre 2008, p. 90
  27. Macintyre 2008, p. 93
  28. Halloran 1986, p. 163
  29. a b c d Chancellor 2005, p. 97
  30. Black 2005, p. 30
  31. Chancellor 2005, p. 96
  32. Chancellor 2005, p. 16
  33. Black 2005, p. 28
  34. a b Cook, William (28 de junho de 2004). «Novel man». New Statesman: 40 
  35. Parker 2014, p. 208
  36. Panek 1981, p. 316
  37. Benson 1988, p. 106
  38. Benson 1988, pp. 106–107
  39. Benson 1988, pp. 107–08
  40. a b Eco 2009, p. 39
  41. a b Synnott, Anthony (1990). «The Beauty Mystique: Ethics and Aesthetics in the Bond Genre». International Journal of Politics, Culture, and Society. 3 (3): 407–426. JSTOR 20006960 
  42. Panek 1981, p. 208
  43. Eco 2009, p. 46
  44. a b Benson 1988, p. 108
  45. Black 2005, pp. 28–29
  46. Fleming & Higson 2006, p. vii
  47. a b Fleming & Higson 2006, p. vi
  48. Panek 1981, pp. 212–13
  49. a b Benson 1988, p. 105
  50. a b Eco 2009, p. 51
  51. Benson 1988, p. 85
  52. Amis 1966, pp. 154–155
  53. Parker 2014, p. 198
  54. Butler 1973, p. 241
  55. Amis 1966, p. 112
  56. Amis 1966, pp. 111–112
  57. a b Bennett & Woollacott 1987, p. 28
  58. a b Macintyre 2008, p. 113
  59. Fleming & Higson 2006, p. 227
  60. Bennett & Woollacott 1987, p. 138
  61. a b Sternberg, Meir (1983). «Knight Meets Dragon in the James Bond Saga: Realism and Reality-Models». University Park: Penn State University Press. Style. 17 (2): 142–180. JSTOR 42945465 
  62. a b Richardson, Maurice (14 de abril de 1957). «Crime Ration». The Observer: 16 
  63. a b Boucher, Anthony (8 de setembro de 1957). «Criminals at Large». The New York Times: BR15 
  64. Lycett 1996, p. 313
  65. a b Lindner 2009, p. 16
  66. Sidey, Hugh (17 de março de 1961). «The President's Voracious Reading Habits». Life. 50 (11): 59. ISSN 0024-3019 
  67. Parker 2014, pp. 260, 262
  68. Lycett 1996, p. 383
  69. Bennett & Woollacott 2009, pp. 17, 21
  70. Parker 2014, p. 239
  71. Symons, Julian (12 de abril de 1957). «The End of the Affair». The Times Literary Supplement: 230 
  72. «New Fiction». The Times: 13. 11 de abril de 1957 
  73. Pearson 1967, p. 99
  74. Kirsch, Robert R. (28 de agosto de 1957). «The Book Report». Los Angeles Times: B5 
  75. Fleming, Ian (1 de abril de 1957). «From Russia, with Love». The Daily Express: 10 
  76. Fleming, Gammidge & McLusky 1988, p. 6
  77. McLusky et al. 2009, p. 5
  78. McLusky et al. 2009, p. 135
  79. Brooke, Michael. «From Russia With Love (1963)». Screenonline. British Film Institute. Consultado em 11 de fevereiro de 2019 
  80. Barnes & Hearn 2001, p. 21
  81. Benson 1988, pp. 172–174
  82. «From Russia with Love». BBC Radio 4. Consultado em 11 de fevereiro de 2019 
  • Amis, Kingsley (1966). The James Bond Dossier. Londres: Pan Books. OCLC 154139618 
  • Barnes, Alan; Hearn, Marcus (2001). Kiss Kiss Bang! Bang!: The Unofficial James Bond Film Companion. Londres: Batsford Books. ISBN 978-0-7134-8182-2 
  • Bennett, Tony; Woollacott, Janet (1987). Bond and Beyond: The Political Career of a Popular Hero. Londres: Routledge. ISBN 978-0-416-01361-0 
  • Benson, Raymond (1988). The James Bond Bedside Companion. Londres: Boxtree Ltd. ISBN 978-1-8528-3233-9 
  • Black, Jeremy (2005). The Politics of James Bond: From Fleming's Novel to the Big Screen. Lincoln: University of Nebraska Press. ISBN 978-0-8032-6240-9 
  • Chancellor, Henry (2005). James Bond: The Man and His World. Londres: John Murray. ISBN 978-0-7195-6815-2 
  • Eco, Umberto (2009). «The Narrative Structure of Ian Fleming». In: Lindner, Christoph. The James Bond Phenomenon: A Critical Reader. Manchester: Manchester University Press. ISBN 978-0-7190-6541-5 
  • Faulks, Sebastian; Fleming, Ian (2009). Devil May Care. Londres: Penguin Books. ISBN 978-0-14-103545-1 
  • Fleming, Ian (1957). From Russia, with Love. Nova Iorque: Macmillan. OCLC 368046 
  • Fleming, Ian; Gammidge, Henry; McLusky, John (1988). Octopussy. Londres: Titan Books. ISBN 1-85286-040-5 
  • Fleming, Ian; Higson, Charlie (2006). From Russia, with Love. Londres: Penguin Books. ISBN 978-0-14-102829-3 
  • Griswold, John (2006). Ian Fleming's James Bond: Annotations and Chronologies for Ian Fleming's Bond Stories. Bloomington: AuthorHouse. ISBN 978-1-4259-3100-1 
  • Halloran, Bernard F. (1986). Essays on Arms Control and National Security. Washington, D.C.: Arms Control and Disarmament Agency. OCLC 14360080 
  • Lindner, Christoph (2009). The James Bond Phenomenon: A Critical Reader. Manchester: Manchester University Press. ISBN 978-0-7190-6541-5 
  • Lycett, Andrew (1996). Ian Fleming. Londres: Phoenix. ISBN 978-1-85799-783-5 
  • Macintyre, Ben (2008). For Your Eyes Only. Londres: Bloomsbury Publishing. ISBN 978-0-7475-9527-4 
  • McLusky, John; Gammidge, Henry; Hern, Anthony; Fleming, Ian (2009). The James Bond Omnibus. 1. Londres: Titan Books. ISBN 978-1-84856-364-3 
  • Panek, LeRoy (1981). The Special Branch: The British Spy Novel, 1890–1980. Bowling Green: Bowling Green University Popular Press. ISBN 978-0-87972-178-7 
  • Parker, Matthew (2014). Goldeneye. Londres: Hutchinson. ISBN 978-0-09-195410-9 
  • Pearson, John (1967). The Life of Ian Fleming: Creator of James Bond. Londres: Jonathan Cape. OCLC 463251270 

Ligações externas

[editar | editar código-fonte]